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Residência Artística Plasticidade Destrutiva e Ecologia (2021-2022)

Residência Artística de cunho experimental, pautada pelos procedimentos de pesquisa e criação em elaboração pelo Coletivo Ruínas, teve duração de oito meses durante os anos de 2021 e 2022, e foi composta por artistas interessadas em investigações  que o corpo tece com os lugares em que habita e por onde atravessa.

“Procedimentos de Aproximação e Permanência” é o nome dado à pesquisa de campo (Intervenção Urbana) e seu desdobramento artístico, que foi o mote orientador ao longo de todo o processo. Trabalho prático e teórico desenvolvido em formato híbrido (devido à pandemia), com encontros remotos e presenciais (em espaços a céu aberto da cidade de São Paulo). Durante a residência foram realizados compartilhamentos de materiais referenciais, encontros teóricos, caminhadas individuais para mapeamento de lugares determinados da cidade de São Paulo, Intervenções Urbanas e formação prática de Tai Chi Chuan Dao Yin, ministrada por Eduardo Fukushima. Esta técnica foi a referência de movimento comum que apoiou o desenvolvimento de toda a residência.

Foram realizados três momentos de imersão, que variam de 4 a 6 dias cada, respectivamente na Vila de Paranapiacaba, na Tekoá Itakupé no Jaraguá e na ETEC de Artes Paula Souza / Parque da Juventude, bem como quatro Intervenções Urbanas pontuais, com duração de um dia, na Ponte Estaiada, Vale do Anhangabaú, Vila Madalena e Ilha do Bororé. Notamos que estes lugares, sejam públicos, privados, público-privados ou áreas de preservação ambiental,  vêm sofrendo processos de desestatização, intensa verticalização, gentrificação, e refletem impactantes mudanças econômicas, culturais e geográficas em suas paisagens.

A ida a campo proporciona o contato direto do corpo com o meio em metamorfose, criando possibilidades de modificações em nossos corpos e atitudes, estimulando uma ampliação das experiências, por meio de investigações em diferentes territórios na região da grande São Paulo.

Um pouco sobre as inspirações que movem esta pesquisa
O termo “plasticidade destrutiva” em questão se apoia no sentido presente no livro “Ontologia do acidente – ensaio sobre a plasticidade destrutiva”, de Catherine Malabou. O interesse em estudar aspectos da plasticidade destrutiva no indivíduo cria um campo de paralelismos quando posto em relação às investigações de dança nos sítios de demolição residencial. O que nesses lugares me atrai? Quais nexos (éticos, estéticos, econômicos, políticos…) silenciosos meu corpo estabelece com tais ambientes? O que em mim ressoa ruína, escombro, destruição? Como partir da plasticidade destrutiva das ruínas como mote criativo?

O termo “ecologia” se apresenta, grosso modo para a pesquisa, como antagonista às forças humanas de destrutividade do ambiente natural para criação das cidades e sua manutenção. Uma das referências sobre esse termo e significado está no livro “Metamorfoses”, de Emanuele Coccia, com ilustrações de Luiz Zerbini.

O Coletivo Ruínas tem por matriz poética a pesquisa de campo, investigações de dança em sítios de demolição, espaços públicos e lugares de preservação ambiental. Os procedimentos realizados durante os processos de caminhada e deriva geram o material a ser elaborado artisticamente em diversos formatos (intervenção urbana, performance, vídeo, instalação, experimento cênico, peça, …).

O desenvolvimento do trabalho nos sítios de demolição residencial e espaços públicos levou a investigação de campo a outros lugares, aos ambientes de preservação ambiental e natureza. As pesquisas teóricas acompanham todos os momentos da pesquisa prática, tanto em relação a informações técnicas sobre os lugares (geografia, especulação, economia), quanto a estudos sociais, científicos, filosóficos etc. Estudos sobre o conceito de antropoceno apoiam a pesquisa.

“O entendimento e a compreensão de que não há divisão entre cidade e floresta, biologia e cultura (e tantos outros opostos possíveis), e que o planeta Terra é todo interconectado, tal como todas as formas de vida orgânica e inorgânica que o habitam, e protegido pela cápsula atmosfera, tornam apavorante a ação humana de destruição da e na Terra. Segundo a teoria do antropoceno, o ser humano é hoje a maior força geológica de destruição da Terra. Como parte da espécie humana, me sinto provocada em promover reflexão e mudança de hábito cotidiano, visando uma vivência menos destrutiva com o meio ambiente e com o que nele vive, ao mesmo tempo em que percebo reproduzindo padrões, consumindo em supermercados e produzindo muito lixo. Sinto que esta situação gera frustração e impotência.

Pensar em agir planetariamente no contexto avançado de capitalismo global e fragmentado de opiniões, com tendências aos opostos radicais, tem me feito considerar sobre a capacidade efetiva de ação. É possível agir planetariamente? Se sim, como? Cuidar da manutenção da minha própria vida e integridade, principalmente em tempos de pandemia, enquanto trabalhadora informal, com filho pequeno, atuando como pesquisadora e artista cênica, já parece tarefa impossível.

Neste contexto, manter a integridade e a sanidade tornaram-se vitais. O estresse, a insegurança, o medo e diversos afetos urbanos cotidianos, para quem vive em uma megalópole como São Paulo, são incorporados e considerados normais, e parece fazer eco com o os procedimentos do “novo normal pandêmico”.

Diante do recorte exposto e da percepção de ser natureza, tal qual um rio, uma pedra ou um pássaro, promover práticas de autocuidado e auto cura e, a partir dessas práticas, criar performance, tem se mostrado como ação individual e local possível e, considerando a interconectividade planetária, somado na criação de porvires mais gostosos.” (Michele Carolina)